Atentado à Democracia

 Não há regimes perfeitos, logo, não há democracias isentas de desequilíbrios. O Homem, na permanente inquietação que o consome e o define, tem frequentemente dificuldade em reconhecê-lo, em assumir que muitas vezes, devido à complexidade da sua natureza e interacção, não é possível melhorar um sistema para além de um determinado ponto de equilíbrio atingido. Todas as ideologias são lógicas e harmoniosas e, se não esbarrassem na realidade da natureza humana, seriam todas aplicáveis e consonantes com um bem-estar geral. A demanda incessante por um cenário idealizado e incongruente com o que a realidade permite, carburada por uma constante inconformação ingénua, ou manipuladora, resulta normalmente em modificações inconsequentes e num agravamento de uma situação impassível de qualquer melhoria. Não que uma democracia, regime consensualmente predilecto de quem preza a liberdade, deva ser estanque e acomodada. Não. Uma democracia deve ser aberta e dinâmica. No entanto, o reconhecimento de que o ideal não existe deve também estar presente numa democracia madura e saudável, que se edifique e aja em consonância com as vicissitudes do âmago humano. A afirmação de Churchill de que “a democracia é a pior forma de governo, à excepção de todos os outros já experimentados ao longo da história” é bem ilustrativa da inexistência de regimes perfeitos. Ainda assim, muitas democracias carecem, ainda hoje, pela sua juventude, pela sua ingenuidade e/ou pela sua manietação, de aperfeiçoamentos perfeitamente alcançáveis e congruentes com as idiossincrasias do Homem. Porém, políticos e a população em geral justificam por vezes a impossibilidade de limar as arestas do sistema com exemplos artificiosos, sobranceiros e/ou demagogos que apelidam, mui ironicamente, de Atentados à Democracia. Mas, Atentado à Democracia é:

– defraudar eleitores, mentindo-lhes deliberadamente para alcançar o poleiro, acenando-lhes com um programa eleitoral fictício;

– o eleitor defraudado continuar a defender quem o defraudou!

– a polícia identificar pessoas que protestam pacificamente e em pleno respeito pelas normas constitucionais;

– a inexistência, afirmada repetidamente por representantes de orgãos de soberania, de uma separação clara entre o poder político e o poder judicial;

– proferir declarações como “a democracia é dispendiosa” para justificar mordomias injustificáveis e auto-atribuídas quando milhões de concidadãos passam por dificuldades inimagináveis;

– a ausência de competência, credibilidade, moral e/ou ética de determinados agentes e a sua insistência em permanecerem no poleiro, mesmo quando judicialmente desmascarados;

– a atitude jocosa, altiva e indiferente de um eleito perante um protesto;

– justificar regalias ou conflitos de interesse de moral dúbia enunciando leis redigidas pelos próprios;

– racionar medicamentos, ou qualquer outro bem essencial, sob o pretexto da escassez financeira, enquanto se empresta desmesuradamente dinheiro a alguns bancos, escamoteando fraudes e comportamentos selvagens e irresponsáveis das administrações, e se pagam juros insustentáveis aos famigerados mercados, que se auto-regulam pela ausência de preocupações éticas e humanas;

– o estímulo ao egoísmo e a ausência de preocupação com o bem-comum;

– alguns eleitos acreditarem que a eleição é um cheque em branco passado pelo povo;

– procurar afiançar o cumprimento rigoroso das leis sem necessariamente legislar de forma a garantir, na medida do possível, que se faça de facto justiça;

– querer fazer crer que o dinheiro é um bem inestimável e efémero, quando realmente não passa de um bem inesgotável, criado pelo Homem e produzido numa “unidade fabril”;

– tomá-la como garantida e não exercer o direito fundamental que a sustenta: o voto;

– a ausência de participação e crítica cívica construtivas e a projecção de todos os males do regime nos outros;

– desconhecer o seu significado: regime que se baseia na ideia de liberdade e de soberania popular, no qual não existem desigualdades e/ou privilégios de classes.

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