Cidadania do respeito pela diversidade



A Organização da Nações Unidas, constituída em 1945 após a Segunda Guerra Mundial, foi o embrião de um marco axiológico fundamental: o respeito pela diversidade. De facto, após a destruição global e as atrocidades cometidas em duas guerras mundiais, e cientes da necessidade de terminar com a conflitualidade milenar entre as nações que assolara a História da Humanidade, os líderes de cinquenta e um países perceberam que era fundamental um compromisso para a segurança e a paz internacional. O desenvolvimento de relações amistosas estáveis e duradoiras, promotoras de progresso social e de um aumento generalizado da qualidade de vida das populações, passou a estar no centro das preocupações e a nortear as ações políticas globais. O entendimento de que o mundo nada mais era do que uma aldeia e de que a maior riqueza da humanidade era a sua diversidade sedimentaram-se como o esteio de documentos fundamentais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) ou a Declaração sobre Bioética e Direitos Humanos (2005). A assunção de princípios e valores comuns e transversais à espécie humana, assentes numa laicidade ética, foi a maior conquista da Humanidade que urge defender a todo o custo. Será sempre perigoso baixar a guarda, adoptar uma atitude laxista e tomar essas conquistas como garantidas.

Neste âmbito, a educação precoce e contínua para uma cidadania responsável, exigente, atenta e participativa assume particular relevância. A eterna imperfeição do ser humano, as injustiças que ainda hoje existem, as fragilidades da Democracia (“o pior dos regimes à exceção de todos os outros”) e os conflitos primários e estapafúrdios que decorrem em vários pontos do planeta, elevam a nossa responsabilidade e o dever de fazermos tudo o que estiver ao nosso alcance para zelar pelos direitos humanos fundamentais. Assim poderemos prevenir uma escalada autodestrutiva e preservar uma imprescindível solidariedade intergeracional. No seio de uma organização social sistémica, sem espaço para bairrismos saloios, é crucial educar para uma cidadania solidária e tolerante, sem impor mundividências e sublinhando o primado do respeito pela diversidade como o esteio fundamental de uma sociedade harmoniosa, próspera e pacífica. Assiste a qualquer pessoa o bem inestimável da liberdade e o direito às mais diversas opiniões e formas de estar. Por sua vez, num Estado de Direito democrático, existem mecanismos para solucionar situações em que a liberdade pessoal colida com o bem-estar alheio, individual ou coletivo. Contudo, em nenhuma circunstância é aceitável impor a outrem opiniões, ideologias, pensamentos ou crenças religiosas. Prezar a Democracia é ter a capacidade de reconhecer que a nossa liberdade termina onde começa a do outro. É perfeitamente admissível, por exemplo, não gostar de animais ou acreditar em coisas totalmente descabidas e ridículas (como que a homossexualidade é uma doença) desde que esteja sempre bem presente a necessidade imperiosa de respeitar a diversidade, de evitar colisões fraturantes com legítimos pensamentos alheios e de não colocar em causa a integridade física ou psicológica de alguém que não comungue da mesma opinião. Mitos, preconceitos, crenças infundadas ou desinformação combatem-se com educação e literacia, não com proibicionismos ou medidas impositivas de pensamento.

A educação para uma cidadania assente no respeito pela diversidade deve iniciar-se em tenra idade, sendo da maior importância ter bem presente que as crianças gozam de estatuto moral absoluto, mesmo quando não têm, ainda, capacidade plena para se autodeterminarem. Os pais não são donos dos filhos, apenas seus tutores provisórios. Assim, a sociedade dever-se-á manter permanentemente vigilante no zelo pelo superior interesse de todos os menores. Aqui o papel das escolas é fundamental e deve focar-se no desenvolvimento de uma cidadania suportada nos direitos humanos e centrada no respeito pelo outro como o marco axiológico fundamental da paz e da harmonia social. Há que ter, no entanto, cuidado para evitar imposições doutrinárias que atropelem a autonomia parental exercida de forma adequada e, mais importante, a dignidade da criança. Salvaguardar os direitos das minorias e dos mais frágeis é um dos mais relevantes objetivos e desafios da Democracia.

Só entendendo que o esteio fundamental de uma sociedade evoluída e pacífica é o respeito inalienável pela diversidade, que o ser humano é imperfeito e que a nossa liberdade termina onde começa a do outro, poderemos construir um mundo cada vez melhor.


Mensagens populares deste blogue

Herói? Nunca fui, não sou e não quero ser.

A Profissão Médica

Democracia ou Ditadura do Politicamente Correcto? Democracia.