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Herói? Nunca fui, não sou e não quero ser.

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No artigo de opinião intitulado “A Profissão Médica” , publicado no Observador a 12 de março de 2021, já sublinhei que um Médico exerce uma profissão legalmente regulada, com deveres e direitos. Contudo, em face da degradação contínua a que venho assistindo desde há anos da profissão médica, sinto-me compelido a abordar de novo o assunto No cartão da Ordem dos Médicos lê-se a seguinte citação: "A saúde do meu doente será a minha primeira preocupação". Não, lamento. A minha saúde é a minha primeira preocupação. São estas afirmações que enraízam na opinião pública a ideia da Medicina como um sacerdócio e não como uma profissão . Ao alimentarmos (nós, médicos) esta romantização completamente despropositada, colocamo-nos à mercê da demagogia e do ataque aos nossos direitos laborais. É surreal e degradante uma classe profissional, por exemplo, aceitar ser obrigada a horas extraordinárias ou ter aceitado passivamente que os médicos ficassem impedidos de sair do SNS durante a pa

Proposta da Nova Lei de Saúde Mental - algumas considerações

a vermelho: sugestões de alterações/considerações. CAPÍTULO I -   artigo 2º, a):  "...das esferas cognitiva, emocional  e/ou  comportamental" -  artigo 2º, b)  -  no âmbito de várias doenças mentais, tenho algumas reservas clínicas, éticas e forenses relativamente às condições em que um doente poderá ter formulado uma diretiva antecipada de vontade (DAV) ou nomeado um procurador, pelo que este assunto deve ser melhor estudado, discutido multidisciplinarmente e ponderado antes de ser consagrado em lei. CAPÍTULO II -  artigo 3º, 2  - "...evolutiva  e flexível , adaptando-se..." -  artigo 4º, 1 -, e)  "A existência de serviços de saúde mental, abrangentes e integrados,   com gestão autónoma e sob dependência hierárquica direta do Ministério da Saúde, representado localmente pelo Conselho de Administração da Unidade de Saúde ou Hospital que integram. CAPÍTULO III SECÇÃO II Casos especiais artigo 10º  -  as mesmas reservas relativamente ao que disse anteriormente no

Premissas básicas para um País evoluído, dinâmico, influente e resiliente

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Reformar a Saúde Mental

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      Em primeiro lugar, parabenizo o  Observador  por, dentro das suas competências e possibilidades, colocar o tema da Saúde Mental na “praça pública”. Espero que se possam desconstruir tabus, desmistificar preconceitos, combater o estigma, eliminar a desinformação e sublinhar a importância do tema para a sociedade. De facto, apesar do seu enorme impacto clínico, sociofamiliar e económico, as perturbações mentais não têm ocupado o lugar de relevo que merecem, e que se exige, nos centros de decisão. Apesar de vários planos e ideias redigidas, a verdade é que pouco tem saído do papel ou o que sai tem, em geral, sido efetivado de forma soluçante e muito insidiosa.    Pessoalmente, e tomando como exemplo as reformas de saúde mental e a sua operacionalização nos países mais evoluídos (como os escandinavos), considero que há linhas de atuação verdadeiramente essenciais, sem as quais pouco, ou nada, se alterará de significado. O inverno demográfico e a evolução tecnológica promoverão, forço

Portugal, eternamente vulnerável

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   Em artigo anterior , já sublinhei que ser médico é uma profissão com direitos e deveres, pelo que quem escolhe sê-lo tem, obviamente, legítimas aspirações de ser bem remunerado. Um médico lida com uma necessidade básica consagrada nos direitos humanos elementares, a saúde, assim como outras profissões lidam com outras (um professor com a educação ou um engenheiro com a habitação). Porém, no caso dos médicos, sociedades iletradas, mesquinhas e desdenhosas tendem, geralmente, a vilipendiá-los por terem rendimentos acima da média! Nos países verdadeiramente evoluídos aceita-se tranquilamente que estes profissionais sejam devidamente remunerados e que as horas extraordinárias, desde a primeira hora (em qualquer profissão, aliás), sejam devidamente pagas para compensar o profissional que abdica da sua vida pessoal para trabalhar. Na pandemia, numa situação de aperto, os médicos, e os profissionais de saúde em geral, foram apelidados demagogicamente de heróis. Passada a aflição, rapidamen

Cidadania do respeito pela diversidade

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A Organização da Nações Unidas, constituída em 1945 após a Segunda Guerra Mundial, foi o embrião de um marco axiológico fundamental: o respeito pela diversidade. De facto, após a destruição global e as atrocidades cometidas em duas guerras mundiais, e cientes da necessidade de terminar com a conflitualidade milenar entre as nações que assolara a História da Humanidade, os líderes de cinquenta e um países perceberam que era fundamental um compromisso para a segurança e a paz internacional. O desenvolvimento de relações amistosas estáveis e duradoiras, promotoras de progresso social e de um aumento generalizado da qualidade de vida das populações, passou a estar no centro das preocupações e a nortear as ações políticas globais. O entendimento de que o mundo nada mais era do que uma aldeia e de que a maior riqueza da humanidade era a sua diversidade sedimentaram-se como o esteio de documentos fundamentais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) ou a Declaração sobre Bioét

A ansiedade é doença?

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  Antes de abordar o tema a que o título alude, gostaria de iniciar este artigo com duas considerações relacionadas e de grande importância. A primeira, é alertar para a predisposição generalizada das sociedades contemporâneas se focarem numa visão excessivamente idílica do mundo e do ser humano. Por um lado, enfatiza-se, de forma desfasada da realidade, o Homo Sapiens Sapiens como uma espécie inata e generalizadamente dotada de uma bondade pura e, por outro lado, insiste-se num primado do belo sobre o feio (no sentido estético e moral da vida), escamoteando a existência de condições aversivas como a violência ou a crueldade. A segunda, diz respeito à propensão frequente para a “psiquiatrização” de emoções, como a tristeza ou a ansiedade. Porém, estes “estados de alma” têm relevantes funções filo e ontogenéticas, ou seja, são essenciais para a sobrevivência das espécies e para o desenvolvimento harmonioso do indivíduo, respetivamente. A tristeza, por exemplo, é fundamental para reagirm